"Entre a dor e o nada o que você escolhe?"


“Se procurar bem você acaba encontrando.
 Não a explicação (duvidosa) da vida,
 Mas a poesia (inexplicável) da vida.”


É estranho como a vida permeia as ideias e as ideias a nossa vida. De uma hora pra outra a gente percebe o quanto os momentos podem ser diferentes, muito embora similares ou desconexos. Por exemplo, eu, num bar, com uma maluca.

Faltando pouco pra uma da manhã, depois de várias doses duplas, Marry resolveu dizer que estava deprimida. Eu fiz a suposição de que era o efeito depressivo do álcool, porém ela disse com veemência que não era isso:

- Não, isso não é culpa do álcool. A culpa é que eu me dediquei demais ao Mario, passei por muitos problemas. E depois dessa gota d’agua que cometi, com toda a certeza, ganhei um tíquete pra morte.
- Ele não vai te matar!
- Você não o conhece! Eu que acho que conheço, sei que não faço a mínima ideia do que se passa naquela cabeça monstruosa.

Conversar com ela, conhecer a história dela foi como ler um folheto, uma página na internet sobre assuntos policiais, no qual a Marry parecia ser vítima. No entanto, ela não era nenhuma vítima. Ela era apenas um resultado dependente do Mario, ou quase tudo parecia fazer parte dele. Não sei explicar tão bem, mas ele seria como um buraco negro, de forma que ao entrar na vida dele você jamais teria como escapar. A Marry achava que de repente poderia se ver livre dele, então conversando comigo desvencilhou coisas que eu pensei só existirem em programas de TV, mas tive certeza de apenas uma fato, eu estava prestes a entrar num mar de absurdos do qual poderia não sair vivo. Mas sem pensar, na realidade por estar envolvido demais, acabei me permitindo penetrar na vida dessa mulher.

Confesso que até então, todas as mulheres que eu tinha convivido, eram aparentemente normais, comuns, e com problemas pessoais compreensíveis. Agora a situação tinha mudado completamente. Acho que eu realmente surtei ao conhecer alguém completamente fora dos meus padrões. Mesmo assim permaneci encontrando com aquela mulher, dia após dia.

- Eu não deveria estar aqui contigo, Marry.
- Se você tivesse alguma falta de interesse, ou desgosto, ou seja lá uma desculpa qualquer, concordaria. Porém, você quer estar aqui.
- Não é bem assim, mas...
- Porque você tenta se enganar tanto? Confessa que gosta da sensação de perigo!
- Pô, ... você poderia me ajudar, sabe que eu não devia estar aqui!
- Até sei disso, mas desde aquele dia que te vi naquela espelunca, eu já sabia que seria inevitável. É corpo baby, entenda!
- Também senti isso, só que estar com você parece ser uma transgressão da lei. Seria menos perigoso sair pela noite, tomar uma vdka e fumar.
- Talvez seja.
- Eu temia isso.
- Bem que você merecia algo a mais, mas será que você queria outra coisa?

Essa pergunta me fez calar, mesmo eu ainda não sendo capaz de compreender o que isso tinha de significativo dali em diante. De qualquer forma eu já sabia que não tinha como voltar atrás, principalmente por não querer.

Após sair do bar, pegamos a estrada em direção a praia, parei o carro atrás de alguns coqueiros. Saí e me sentei na frente do carro. Logo depois veio a Marry com aquele olhar que me atravessava o corpo, sentou do meu lado e virou lentamente o rosto em minha direção.

- Você sente?

Quase que dolorosamente olhando com toda a vergonha que eu pensava não ter, respondi:

- Depende, vergonha eu garanto que estou sentindo. Porque você faz isso com o olhar?
- O que eu faço com o olhar?
- Você me atravessa o corpo inteiro.                                  
- Não sei o que é, mas isso me respondeu a pergunta que eu fiz.

Ficamos por lá até o sol nascer e depois a deixei na casa da minha tia. Saindo de lá logo depois que ela entrou. E não faço ideia do porque continuei com a sensação de que ela continuava olhando fixamente pra mim.

É um jeito estranho a forma que tudo acontecia, eu nunca tinha visto a Marry da forma como eu a via após esse encontro, as conversas. Até então, ela era apenas mais uma mulher extremamente sexy que eu tinha visto. Porém conhecendo-a, e querendo desviar a tensão que o olhar dela me causava, percebia que as minhas escolhas estavam afuniladas em direção a ela. O que começara por uma ideia de contato visual tornava-se mais pesado e necessário. Numa boa, se uma mulher linda te encara, na melhor hipótese ela é apenas uma mulher linda interessada em você, e na menor das piores hipóteses é apenas um assédio. Porém no caso dela era bem diferente, e eu sabia que não era boa coisa, mas ela era linda, na boa, a ideia do problema parecia pequena (mesmo não sendo).

"A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos,na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional."

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