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Mostrando postagens de março, 2012

Até o fim

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Durante muito tempo todos os gostos que ele lembrava estavam ligados a Lavínia – o velho vinho de Paris que ela adorava tomar com ele nos encontros, o café amargo do outro dia e o chocolate quente nos dias frios que foram diminuindo até não haver mais nenhum. As lágrimas eram sempre incessantes, ora pela manhã, ora a tarde quando entrava no metrô, ora de madrugada que conseguiam o arrastar da sala até o quarto, como se ele fosse arremessado pra cama, e de tão machucado o corpo, não conseguia se mover. Depois que a Ávila tornara-se presente, conseguia esquecer por pequenos momentos que algo faltava, esquecia o que era uma lembrança doce e amarga. Os olhos ficaram menos inchados, os domingos menos solitários. O telefone não causava mais tanto alvoroço, tanto medo, assim como perguntas simples “como você está?” já não eram tão complexas de responder. Planos foram tecidos, planos foram quebrados. Mas a vida foi objetiva e convidativa. Ela o amou até o ultimo dia de vida, e ele também a

Das expectativas, o que se segue

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Todo dia eu acordo pensando que é um novo inicio, como se a cada manhã houvesse um novo “Era uma vez” e um “Felizes para sempre” ao fim da noite. É que depois de alguns anos vivendo de migalhas de passado, e se alimentando de falsas expectativas, eu cansei. Agora quero apenas me camuflar na arte que a vida cria, sugando o que posso dos meus gostos e querer, aliás, tem nada melhor na vida do que aproveitar nossa alma pra sentir a vida com tamanha intensidade. Não sou mais personagem, mesmo não deixando de ser. Ainda tenho as transformações, mas por agora já não deixo mais de ser eu mesma, e sabendo que amanhã já não serei a de hoje, tenho certeza que ainda serei eu. Por mais que ainda fiquem lembranças, se faltar graça no meu sorriso, peço cocegas. E a cada novo alvo dos meus olhos apetecem gritos silenciosos, por elegância através de palavras nunca ditas. E não ofereço nada, não quero também nada em troca, só espero atenção. Que haja concordância, e algum apuro nas nossas possíveis

A promessa

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Durante as conversas com a Ávila, se sentia menos preso as lembranças, ora amargas, ora doces, ora os dois ao mesmo tempo. Murilo sorriu o velho sorriso de canto de boca, um pouco tímido e triste, mas sorriu. A Ávila se aproximou e comentou: - Ah que tal comer alguma coisa comigo? Pelo que eu fiquei sabendo você anda tão distante do mundo que até esqueceu-se de comer! - Eu? Não. Na verdade, só não sinto fome. - Esquecer é a mesma coisa de não sentir a fome. Eita mania de complicar tudo o que eu digo?! Ele meneou a cabeça. - Sabe, é que parece que a alma tá vazia, e isso parece querer passar por cima de tudo o que eu sinto como se expandisse. - Hum, mas... A interrompeu abruptamente. - É como uma defesa, como se não fosse seguro o suficiente. Ou sei lá, como se eu tivesse que esperar por algo que nunca vai voltar. - Você já parou pra pensar que isso pode passar? - Sei que talvez, tudo nessa vida é relativo quando ligado aos sentimentos. Só que eu tenho medo. Sei que parece um pouco idio

Musicas

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Parei alguns minutos pra ouvir algumas bandas ... buscando determinadas musicas que são como um espelho pra alma.  ReVamp - Kill Me With Silence     Precious -  Lisa Middelhauve   Amaranthe - Call out my name We Are The Fallen -  Without You My heart is broken - Evanescence  The Divine Conspiracy - Epica 

A conformação

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Lavínia morta, com o corpo deitado sobre o caixão. Ao lado uma mesa marrom escura, velas acesas, flores enchendo o ar com aquele cheiro de adeus. Uma chuva intensa caia lá fora, balançando todas as folhas, como se quisesse mostrar a fúria que havia no coração dele, como se aquilo pudesse suavizar tamanha tristeza que se passava por ali. Murilo contorcera todo o corpo no sofá. A mãe o mandara levantar, mexer o corpo, ao menos mudar de posição. A perna já estava começando a ficar dormente, o que o deixara em estado de espera, porque sempre sentia como se agulhas fossem penetrando na perna, finas, e de extensão grande. Ele sabia que nunca mais veria o sorriso da Lavínia, ele tinha certeza disso. E como seguir em frente? Como faria pra encarar os dias que seguiam um após o outro sem ouvir o riso, ver as covinhas serem formados a cada palavra boba que ele era capaz de dizer. Como seria? Os olhos pareciam nuvens de tempestades. Mas ele segurava, tentava, lembrando algumas das palavras dela

A dama e o louco

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Um bocejo por cima do ombro, Meio sorriso é deixado escapar do canto dos lábios, São aqueles olhos tão conhecidos, E ainda a mesma mulher a vos observar. Ela é de todas, A mais triste. Bela por dentro e por fora, De tão perfeita a sincronia entre olhos e sorriso Que de nada mais é preciso, Por si só já é o encanto. É quem faz do poeta palavras doces, Afiadas, Entrecortadas a amedrontar. Ela é dona do sorriso irônico, Que contagia sem ao menos tentar. De tudo o que tem, É capaz de virar o passado ao avesso, De frente pra trás, De trás pra frente. É somente poeira de vidraça, Cor ainda desbotada, Mas de realce transfigurada. Uma moça chorosa, De tristes rabiscos acalentados, Que minhas palavras já não sabem descrever. Um alguém que surpreende, Mesmo que nada a contente. Faltam pedaços pra comparar, Porque de nada tem parecido com tantas outras nos milhões por lá. O poeta se afinca nas robustas palavras, Olhando pra o infinito, Suspirando envaidecido por uma lembrança longínqua

A visita

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Escutou um barulho como uma escala completa de tríades que se repetiram três vezes “pam pim pom”, aquele ruído pareceu conhecido, e então acompanhou os ouvidos com os olhos, seguiu diretamente e com a voz imitou o som que voltou a acontecer. Olhou para a porta a observando ainda da mesma cor e com aspecto velho. Observou que do outro lado batiam e tocavam, chamavam o nome repetitivamente “Murilo, abre a porta cara, preciso falar com você”. Nesta voz era possível notar tamanho desespero, angustia, preocupação. O corpo dele ainda tão fraco, se apoiando nas finas canelas, com dois passos se aproximou da porta, movimentou as mãos numa lentidão daquelas que fazem da distância pequena se tornar longos quilômetros, e foi vencendo a distância. A voz repetiu: - Abre a porta, por favor, preciso saber como você está. A mão tocou levemente o trinco, foi virando, virando e virando. Então, falou com a voz baixa e esvaída. - Já vou. Abriu a porta, e com os olhos doendo, viu primeiramente uma s

Entre as paredes do quarto

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Passado os dias, tudo ainda escuro, a vida parecia ser nada. Murilo mexia todo o corpo, e volta e meia parecia percorrer toda a cama, perna pra baixo, cabeça pro lado, e nenhuma posição o fazia acomodar-se. Deixava o corpo modelar-se, na ponta das mãos os dedos se espalhavam pela extensão do lençol, suadas, e vazias da Lavínia. Passava as mãos nervosamente sobre o rosto, sentindo os olhos não obedecerem ao cansaço que o consumia. Queria ouvir a voz dela, mas o silêncio transfigurava sua ausência muda. Por esforços de tentar descansar, por mais que os braços se atropelassem pra alcançar o vazio deixado, entre as cobertas não havia posição pra diminuir o vazio. Suava frio. As lembranças eram fortes, eram sólidas demais pra serem esquecidas, mas moles demais para que pudesse segura-las. Ainda podia sentir as horas voltar como uma fita de filme antigo; o aroma quente, frio, ora seca, ora úmida. As gotículas da chuva pareciam tocar novamente a pele dele, e na pele da Lavínia, aos poucos,

A esperar

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Eu espero por você Aguardo um sinal E em tal fraqueza me encontro Que não consigo me afastar Eu estarei aqui, pra sempre, com você, Mesmo que esteja distante como nunca antes. Submissa, na singularidade de ser aquilo que nem sei se é suficiente, Sabendo de tal envergadura que me colocastes Encontro-me sem razão A compostura já não me é feitio Nessa doce tortura permaneço Se souber que você ficará bem. Sabes por quantas vezes te observei dormir em silêncio Ouvindo tua respiração Quieta, calada, permaneci. Crucificando meu corpo numa dor emitida pelo coração E ainda assim continuei aqui, E continuo, por mais certo ou errado, não arredo do que sustenta meu mundo.