"Eu sei, é de se assustar essa coisa de finalmente ser par sem ter que se abandonar."

Emudecer o afe (c)to português?
Amputar a consoante que anima
a vibração exa (c) ta
do abraço, a urgência

tá (c) til do beijo ? eu não nasci
nos Trópicos; preciso desta interna
consoante para iluminar a névoa
do meu di (c)to norte.
Inês Lourenço

Um domingo que sem ao menos querer a gente se impõe a escrever, como se a solidão de fora combinasse com a de dentro. Nesse momento já não dá para saber aonde começa e termina essa insólita forma de ser, até onde eu estou sendo apenas como um domingo parado. Aonde a desembocadura do tempo demonstrará minha solidão legítima? Que tal mergulhar ao fundo do fardo da minha sol-i-dão, e trazer sol em tudo isso, com palavras que veranizam e amenizam tantas dores.

Que (des)complexo o tempo, os dias, as horas desde o início sempre são aparentemente tão similares, mas existe algo de infinito nessas coisas finitas, e nelas existe um recomeço, e só assim a gente sabe se continua no fardo ou muda de direção. Sejamos submersos nessa minha confusão atual, ora liberdade, ora solidão, ora as duas coisas. 

Acredito que ao se deparar com uma monotonia turbulenta em que a vida tem mania de nos colocar, das que machucam profundamente, naturalmente a reação de qualquer um é de sobreviver, lutando até perder a última gota de sangue que corre nas veias. É igual a mergulhar em mar turbulento, e não ter forças para ficar na superfície, a água invade os pulmões, forçando para baixo enquanto nossos membros batem e rebatem contra esse impulso, até que a força esvai pelo corpo, e a gente não consegue subir até a superfície, mas no meio de tantos pontos que nos derrubam, quando surge algo para nos segurar na superfície, a gente agarra e não solta mais, porque é a única forma de escapar daquela situação. Assim é o amor sufocante, daqueles que nos prendem até as palavras, sugando o melhor que há de cada um envolvido, até restar apenas a falta de força para seguir. É justamente nesse ponto em que o acostumar faz com que  as forças de sair daquela inércia desapareçam. Esse tipo de amor constantemente nos leva a solidão a dois. 

Venhamos e convenhamos, entre a solidão sozinha e essa acompanhada, é fato que estar só a dois é sofrimento dobrado. 


Por quê? 

É simples, coração sozinho amando outro ausente, é como ter batidas de músicas em ritmos diferentes, desencontrados, sem o menor sentido. Vira apenas barulho. Até que os batimentos vão perdendo o som, e o coração fica oco, de tanto bater sem compasso, o vazio faz sua função de silenciar. O coração fica mudo, e nenhum vocabulário consegue formar-se, porque palavras requerem sentimento, e a solidão, essa é silenciosa. Sons precisam propagar-se, mas quando temos apenas vazio, as leis da física demonstram muito bem sua essência. 

Depois do vazio sobra o fim. Mas aí que temos a parte linda da vida, o fim pode ser o recomeço, igual uma estrela que morre, ela recomeça transformando-se em buraco negro, e então tem outra essência e um novo começo. Deixando um pouco de analogias de lado, nesse ponto de (re)começo, o que precisamos é coragem, deixar as lágrimas secarem, e estampar um sorriso nos lábios. É exatamente esse sorriso que parece imã e atrai novamente os sons, a batida, a força, que vai permitir ao coração entender que a música não pode parar jamais, mesmo quando o sorriso se arriscar, e outra vez o soluço do naufrágio de lágrimas deixar-se transbordar.

Uma hora o coração se encontra, afinal mesmo sangrando, é assim que nos tornamos vivos. Todo coração se encontra. Todo coração já foi ou será quebrado, e se encontrará novamente em outro. O amor é assim mesmo, um encontro e desencontro infinito, até que o coração certo vai trazer o fim da solidão, mesmo que o tempo passe, mesmo que sejam anos; o coração saberá que tem para onde voltar, e voltará, porque lá será o repouso, e o melhor lugar de todos. Um coração ao lado de outro, compartilhando, vivendo, dividindo e sentindo. E principalmente, batendo no mesmo compasso. 

Eu não sei de pássaros,
não conheço a história do fogo.
Mas creio que a minha solidão deveria ter asas.


Alejandra Pizarnik

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