A promessa

Durante as conversas com a Ávila, se sentia menos preso as lembranças, ora amargas, ora doces, ora os dois ao mesmo tempo.
Murilo sorriu o velho sorriso de canto de boca, um pouco tímido e triste, mas sorriu. A Ávila se aproximou e comentou:
- Ah que tal comer alguma coisa comigo? Pelo que eu fiquei sabendo você anda tão distante do mundo que até esqueceu-se de comer!
- Eu? Não. Na verdade, só não sinto fome.
- Esquecer é a mesma coisa de não sentir a fome. Eita mania de complicar tudo o que eu digo?!
Ele meneou a cabeça.
- Sabe, é que parece que a alma tá vazia, e isso parece querer passar por cima de tudo o que eu sinto como se expandisse.
- Hum, mas...
A interrompeu abruptamente.
- É como uma defesa, como se não fosse seguro o suficiente. Ou sei lá, como se eu tivesse que esperar por algo que nunca vai voltar.
- Você já parou pra pensar que isso pode passar?
- Sei que talvez, tudo nessa vida é relativo quando ligado aos sentimentos. Só que eu tenho medo. Sei que parece um pouco idiota ...
- Não é. Bobo.
- Mas é o peso de perder o que nunca se esperou que esvaísse pelas mãos tão facilmente. Eu simplesmente não consigo parar de pensar. Estar com ela, ter ela, afundar no nosso mundo particular.
- O mundo está aí, ela faz parte de tudo isso, então, pra poder senti-la com você é preciso aproveitar o que tem ao seu redor. Vamos, tenta fazer coisas simples, ou coisas que você sempre quis. Andar de barco no meio da semana como se isso pouco importasse.
- Mas eu só quero me esconder.
Ela pensou como poderia ter de frente um rapaz tão jovem, tão triste. Um rapaz triste de frente pra uma moça que já havia sentindo isso como peso morto no corpo todo. No entanto, a história dele tinha algo de peculiar, havia medo de sair do esconderijo aconchegante dele.
Ele estava pegando um pedaço de torta e levando a boca quando:
- Ávila, posso fazer uma pergunta?
- Sim, todas.
- É sobre você.
Ela ficou tensa, sentindo na pele a velha expectativa.
- Você conhece minha dor, mas eu sinto que não por meus olhos, por teus próprios. Estou certo?
- Está.
Respondeu diretamente, sem nem ao menos olhar pra ele.
- Eu já vivi algo parecido, meu querido, e isso eu sei que não passa. Mas você precisa se reerguer, ou a tua tristeza te leva, só que não pra o lugar onde você quer estar.
- E pra onde levam?
- Eu preferi não descobrir. Mas parece que você faz uma tremenda força pra conhecer! (suspirou) Desculpas, desculpas, Murilo, não foi a intensão.
- Tudo bem. Talvez você esteja certa. E talvez a única razão de isso ainda não ter acontecido foi sua presença.
- Ahn...?! Isso é bom?
- Não sei, eu que te pergunto! É?
- Depende, você quer melhorar ou prefere continuar com o corpo preso ao passado?
- Se eu ficar melhor, você me promete não ir também?
- Não, isso eu não posso prometer, só posso prometer estar o suficiente, e estarei com você. Não tenho como saber se isso vai ser bom ou ruim, só espero que seja o suficiente pra ser inesquecível. 

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