Aos passos, aprendendo, como amar
Oi, meu nome vou deixar
em alto, daqui a pouco me apresento melhor. Hoje queria contar minha história, meio
louca, meio atravessada, e um pouco misturada com as insanas imagens que eu
outrora criei de tudo o que passei. Do que acreditei passar, do que poderia não
ter deixado passar e ainda assim passou.
Muitas vezes debruçado
sobre o papel estive a rasgar pensamentos como uma folha com palavras, na
tentativa de apagar da memória o que lá tinha. Eu só deparei bem mais tarde que
não era assim que as coisas aconteciam, simples, as coisas tem horas que ficam
pela metade, pelo avesso e bagunçadas. O que a gente vive, torna o que somos.
Mesmo fora do comum, no emaranhado de coisas que não se pode explicar.
Você já parou o tempo
imaginando e se perdeu com o olhar no meio do nada, então a imaginação ficou
tão real que quase você não volta pra realidade? O que seria prudente,
transformar a tentação em realidade ou esperar a oportunidade que nunca iria
chegar? Sabe, às vezes a vida pode correr por sentidos estranhos, e a tentação,
querer e o ter serem próximos demais, levando a nossas escolhas por vezes
distorcidas a lugar algum. A solução é deixar a alma por fora como uma armadura
pra enfrentar o mundo, e esperar nunca estar sozinho, porque a solidão é sempre
descaminho ou nunca estaríamos procurando alguém.
Eu deveria explicar?
Então, explicarei. Primeiro deixa eu me apresentar, eu me chamo Alfonso, sou um
doido qualquer que vem por acaso e como eu decidi contar minha história, fiquem
a vontade. Não sei até que ponto a minha vida pode ter sentido significativo
pra quem aqui me lê, só posso dizer o quanto viver foi espetacular durante
esses poucos anos. E agora que meu mundo permanece sem cor, embranquecido. Eu
já nem sei discernir as emoções ao certo, simplesmente sinto-as voltarem em
forma de lembranças que me confundem bastante. Quem dera que as pessoas não cometessem
os mesmos erros que eu um dia me deixei cometer.
Dispondo-me a
reexaminar tudo o que vivi, durante os 12 anos aos quais me dediquei, percebi
que por mais que a gente acredite e tenha certeza de algo, essa certeza uma
hora se quebra, por isso volto ao recomeço, pra analisar, reafirmar até que
ponto a realidade é mais clara que a verdade da ilusão.
Eu tinha quatorze anos
quando tudo começou, jamais imaginaria quantas pessoas eu poderia amar ou
sentir, eu somente quis viver cada momento na hora certa. Eu vivi por amar, e
até quando julguei nunca mais voltar a amar eu errei no palpite. Foi trágico.
Eu só percebi tamanho amor que sentia quando estava no alto e já começava a
cair junto a gravidade. Quem dera o engano tenha sido uma vez só. Coração que
ama não aprende lição, porque cada sentimento exposto é diferente, é único.
Então, jamais vai amar alguém como amou a outro, nem muito menos quantificar
por uma equação. É simples, a gente ama cada qual de uma forma, e é essa
diferença de amar que se dá e recebe de volta.
Seria justo contar
todos os encontros a dois aos quais eu me apaixonei perdidamente, mas prefiro
dedicar-me a quem já amei, amor, e morri amando. É equitativo falar apenas de
quem foi capaz de me mudar por dentro.
Minha primeira paixão
foi desconcertada ao extremo. Coisa que a gente jamais espera acontecer. Era
uma sexta feira como outra qualquer, no corredor da escola, eu avistei do outro
lado pela janela da sala, a passos lentos, demorados, como quem anda
exuberante, chamando toda atenção. Nessa hora todos resolveram parar pra
observa-la.
Não haviam regras, e eu
nem sabia qual rumo era o que estava tomando. Eu poderia seguir minha vida
curta como sempre fora até então, mas adorei o fato da complexidade. Meu caro
vou admitir, regras são simples, é só seguir. Relacionamentos são mais
profundos, deixam perguntas e respostas soltas, e talvez você descubra o amor
ou talvez não.
A verdade é que eu estava
um tanto assustado, e ainda assim me permiti passar acima do que eu temia. Os
olhos pareciam acompanhar os passos. Um, dois, três, quatro passos e os olhos nem
sequer piscavam pra não perdê-la de vista. Foi a primeira vez que vi a Kristina.
Morena dos cabelos lisos e ondulados nas pontas, olhos escuros e brilhantes.
Olhar de menina. Tinha uns dois anos de diferença, era um pouco mais velha que
eu. A partir daquele momento com tudo diferente eu sabia o que queria, só não
tinha certeza se tinha força o suficiente pra alcançar. Nesse tempo eu ainda
não sabia que eu era mais forte do que imaginava, acho que não acreditava muito
que eu poderia tudo o que quisesse se eu realmente fosse até o fim das
consequências. Ou seja, por amor. Apesar de toda a confusão por dentro, e de
nenhum contato, eu tinha que encontrar uma forma de me aproximar. Como eu não
procurei, nem sequer tentei. O destino resolveu isso por mim (adoro essa parte
que o destino me chama de imbecil e fala “já que você não serve pra isso, eu
ajudo”).
Sentado numa roda de
amigos, no meio de uma conversa, ela e algumas amigas se aproximaram pra
conversar. Meias palavras tocadas, eu permaneci na minha velha defensiva de
quem apenas quer observar. Observei. Me aproximei. Durante aproximadamente dois
anos eu apenas detive a me aproximar, a conversar. Até que uma hora eu me
perdi, me deixei levar. O que eu posso dizer? Nunca desconsidere as emoções por
mais simples, se deixe levar. Sentimento é a linguagem que o coração usa pra se
expressar. Portanto, se entregue!
Num desses dias em que
a minha turma de amigos resolvia se encontrar na casa do Erick, pra velha
social de todo inicio de final de semana, a Kristina me pegou pela mão puxando
de leve como quem simplesmente pede educadamente sem palavras, por gentileza
pra acompanhar. A gente se afastou um pouco mais e nos sentamos no chão de um
corredor que levava pra a área de serviço. Sentados de frente pra o outro, ela
resolveu me perguntar:
- Você está gostando de
alguém?
Naquele momento eu
quase coloco o coração pra fora da boca, não esperava essa pergunta. Aliás,
essa pergunta bateu como se fossem trezentos martelos na minha cabeça em menos
de um segundo. Eu como nunca fui bom em respostas prontas, mas sempre aprendi a
lidar com as situações inesperadas de uma forma irônica, olhei de volta nos
olhos como se eu estivesse realmente seguro do que estava a falar:
- Estou sim.
Observei o drama de querer
saber muito mais sair do olhar dela, e confesso que saiu um sorriso irônico do
meu rosto. Ela não conteve a curiosidade (o que é bem normal, mulheres são
curiosas por natureza) e continuou a perguntar.
- Ahh então me conta
mais, quem é? Posso saber?
- Depende, o que você
quer saber?
- O que você sente?
- Não sei o nome do que
sinto, eu apenas sei que sinto.
- E o que significa?
- Significa que talvez
esse sentimento não termine em nada.
- Você vai desistir
dela?
- Eu não disse isso, ou
disse?
- Bem, não, mas ...
- Kris, pode ser que
amanhã eu já não sinta mais nada, mas enquanto eu sentir o que quer que eu
esteja sentindo, eu sei que vai haver um caminho pra percorrer até ela.
- Ela tem sorte, sabia?
- Tem?
- Tem sim.
Saiu um olhar triste
que penetrou diretamente no meu. Como eu não era somente um inconsequente que
estava a gostar da Kristina logo percebi que aquela tristeza não era nada boa.
Era de quem estava sofrendo. Vi o rosto dela decair junto com o olhar direto
pra o chão, e então toquei o rosto dela como sempre fazia falando:
- Eii, levanta o rosto.
Nada de ficar triste. Porque ficou assim?
- É coisa de quem não
tem a mesma sorte da sua amada.
- E quem disse que não?
- O destino.
Ela me olhou de volta e
abraçou. Foi um abraço triste em todos os aspectos. E eu não ousei me
aproveitar da tristeza dela pra tê-la. Na hora eu pensei nela, mas depois
percebi que talvez aquela tivesse sido uma oportunidade e não somente uma
tentação. Eu não estava atento que aquele era um momento importante, e que
talvez fosse uma única vez que acontecesse. Porém eu ainda não sabia quais as
marcas do destino, tinha na cabeça que quando as pessoas se gostam mesmo, no
fim, ficarão juntos se assim tiver de ser, e naquele instante eu só queria
cuidar dela. Momento como esse se repetiu algumas vezes, mas alguns meses
depois, eu percebi que ela não sofria por ninguém, e sim por mim.
- Ei, Alfonso, posso te
pedir uma coisinha?
- Lá vem você, o que
você já quer?
- Você!
- Hã?
- Deixa eu terminar a
frase? Você tá aí na frente, deixa eu ficar no teu colo? Fica melhor pra eu ver
o filme. Prometo que eu não mato você.
Nesse momento todo mundo
resolveu jogar as almofadas em mim, o que fora conveniente, depois de um pedido
desses?!
- Pode vir sim, e nem
precisa trazer a almofada, eu não vou devolver a de ninguém.
Todos começaram a rir.
Então começamos a ver o filme.
A turma havia locado o
filme “A casa de cera”, afinal suspense é sempre interessante. Pipoca,
brigadeiro e coca cola. E claro, ela no meu colo. Até hoje me pergunto o que
mais eu queria naquele momento, e sempre me respondo “que ele tivesse demorado
mais”.
Logo no inicio do
filme, como sempre, todo mundo inquieto, e fazendo piada (filme em grupo sempre
é assim), noto uma puxada de leve na manga da minha camisa azul marinho. E bem
baixinho ela fala:
- Estou com medo.
Eu olhei pra ela como
quem olha algo indescritível e sorri de canto de boca, toquei a ponta do nariz
e falei:
- Calma que depois
piora. Brincadeira, eu estou aqui, qualquer coisa é só abraçar?!
- Pode mesmo?
- Pode.
Ela me abraçou.
Simples. E foi assim até o fim do filme.
Quando o filme terminou
ainda ficamos conversando, mas eu tive que deixar as meninas nas casas delas, e
claro, a ultima casa a qual parei foi na de Kristina assim que deixei a Sarah.
Durante o caminho da casa da Sarah até a de Kristina fomos andando lado a lado
sem olhar muito um pra o outro, acho que era receio. Pela primeira vez eu tinha
pensado que perder a amizade dela por uma noite poderia ser uma má escolha. Ou
talvez aquele pensamento era apenas medo (e quem não tem?). De frente a casa
dela apenas olhei e falei:
- Prontinho, a ultima a
ser entregue (e olhei com a cabeça um pouco na horizontal).
- Quase, espera mais um
pouco?
Como eu já estava de
costas virei lentamente pra ela.
- Espero.
Essa parte é muito
confusa, eu não me lembro ao certo os detalhes. É que foi muito forte. Ela se
aproximou, tão lentamente quanto eu. Continuou me olhando. Me questionou.
- Como eu faço pra não
te deixar ir?
- Nada.
- Nada? Como nada?
Eu ri com o espanto
dela.
- Nada. É só ficar
comigo, porque eu estava te esperando. Já faz tempo. E eu ando sentindo muito
sua falta.
Essa parte eu não
preciso explicar não é? Ou vocês querem os detalhes? Nem vou perguntar. Melhor
pular entre reticencias.
Passei por muitos
momentos bons com ela, até o momento da despedida. Ela ia morar em outro País.
Quando recebi a notícia senti uma tristeza grande. Até então eu ainda não tinha
me apaixonado por ninguém além dela, e não sabia o desespero de perder. É estranha
a sensação grandiosa que se tem nos primeiros momentos de uma tristeza, seja
ela qual for. Ela foi pra longe e eu permaneci quatro meses sem me apaixonar
por mais ninguém. Durante todo esse tempo permaneci dentro de casa, apenas
esperando alguém que não iria voltar. E ao mesmo tempo certo de que a vida
continuava.
É meio louca a primeira
paixão. Nada acontece demais, e mesmo assim é uma das melhores, se não uma das
mais importantes. Mas como as coisas são passageiras, sempre entra alguém pra
contornar toda a situação. É mais ou menos assim, você escuta uma musica e ela
parece a mais perfeita de todas, até que um dia simplesmente você prefere não
escutar e então, surge uma nova musica que parece ser a mais perfeita de todas
ou tem um significado que muda tudo na sua vida.
Eu permaneci um bom
tempo naquela imaginação de que as coisas ficariam “bem”. Então fui acumulando
trechos, frases, musicas e todo tipo de quinquilharia que me trouxesse a
essência da Kris. Posso dizer que era quase uma doença. É como se as lembranças
me trouxessem o perfume dela pra perto de mim. Eu tranquei meu coração pela
primeira vez até um dia como um que a gente jamais é capaz de esquecer.
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