"Existem 2 tragédias na vida. Uma é perder o que o seu coração deseja. A outra é conseguir."


“Conhece alguém as fronteiras à sua alma, para que possa dizer - eu sou eu?


Eu posso dizer que sempre fui um cara bom, aquele que andava na linha e mesmo se enrolando na linha, tentava ao menos acertar os passos, mesmo que por hora pudesse ser um verdadeiro perigo. Mas não foi assim pra sempre, uma hora a gente aprende a deixar as coisas permearem por si mesmas.

Eu era um cara bom, não sei se pela simples forma de subordinar-se as paixões complexas, profundas e desgrenhadas, ou pela leitura dos versos nunca citados, ou ainda pela velha musica que sempre repetia “Northern downpour” quando sentia que as coisas podiam estar menos interessantes. Ninguém nunca pensou na possibilidade da mudança, apesar de bom, um whisky vai, um Gim vem e acaba que ninguém é santo.

Alfonso: Não, definitivamente eu não sou um cara legal, mas eu queria ser assim. Sim, querer do verbo pretérito. Depois de notar que quem eu queria simplesmente não merecia meus sentimentos e estando namorando já a algum tempo, resolvi que era a hora de me libertar, modificar, e claro, ser completamente mau, se necessário.
Dávila: Enrolação? Pare logo com isso, conte a história toda. Fale realmente quem te fez esquecer a mim!
Alfonso: Você reclama, reclama que eu me intrometo, mas não fica por baixo pra se intrometer?!
Dávila: Perguntei alguma coisa? Estou falando pra você continuar!
Alfonso: Ohhh grande perfeição da natureza do mundo todo, obedecerei a senhora.
Dávila: Palhaço!

Ora, eu não sabia ser malvado, mas não era bom e realmente não sabia ser assim, avesso, não que fosse interessante pra alguém ser ruim, mas a minha falta de malícia diante dos outros era no mínimo péssimo e eu tinha que mudar isso. Por algum tempo passei noites acordado levando tantas broncas da Helen e Diana. Eu estava me sentindo quase desumano. Eu tropeçava nos meus roxos, reclama muito, me autoflagelava com as navalhas das próprias palavras. E o que era bom em mim quis morrer. Porque o bom, às vezes, fica fraquinho e parece morrer. Não que suma ou morra, mas parece morrer. E como até a minha melhor parte sempre fora de nunca se render, nunca morrer. Viveu meu lado bom por amor ao que odiava. Amar.

Um dia, resolvi dar uma saída sem minha namorada que não reclamou, mas aceitou (na época estava ainda com a Diana), enquanto passava pela praça vi uma flor - não sei o nome porque realmente não entendo nada de flores – peguei, e continuei andando. Mais a frente por uma troca simples de olhares, vi uma moça de olhos grandes, fortes, ela tinha olhos como a flor que eu tinha pegado minutos antes. Sabe aqueles olhos que sucumbem à própria pessoa como extensão da alma? Era exatamente assim. Na hora eu não me importei muito, e no meio das pessoas eu permaneci conversando, falando bobagens e perturbando alguns amigos. Conversamos muito pouco, aliás, foram poucas as palavras trocadas. Ela por algum acaso me pediu o número do celular, que eu dei (supondo que jamais fosse receber a ligação) assim como a flor que tinha nas mãos também, por representatividade (na realidade nem sei porque dei essa flor, foi completamente fora do que eu faria – estranho – acho que era apenas porque me lembrava o olhar dela).

Ela não me ligou, nada disse. E só voltei a reencontra-la por um acaso, no meio de um barzinho com alguns amigos. Eu não faço ideia de onde veio a coragem de ir lá e falar com ela, mas a parte mais extravagante desse momento é que depois do inicio da conversa, ficamos até a hora do bar fechar conversando e os amigos dela com muita raiva de mim por ela estar me dando toda a atenção.

Depois desse encontro casual e engraçado, me descobri feliz de certa forma através dela. Era simples, apenas uma conversa mole entre ambos, e uma cumplicidade criada. O vínculo fora criado. E a reciprocidade de confianças trocadas ao ponto de ambos falarmos de momentos que nos machucamos. Falei sobre a Ávila, descrevi tudo até então vivido. Ela por algum motivo sentira por impulso a necessidade da conquista, e como um alvo machucado é sempre interessante, não perdera tempo. O que eu não esperava era o que vinha pela frente.

Eu um garoto, ela uma menina mulher, ambos fascinados um pelo outro, afinal como eu iria resistir àquela mulher? Eu escondi dela por algum tempo que tinha namorada, e claro, porque não esconder? Eu estava adorando o jogo de sedução e a sutileza da situação. Mas pra meu desengano ela tinha namorado, e falou abertamente que namorava. Eu acabei cedendo e falando que fazia um bom tempo que também estava namorando, mas que de fato o namoro aos poucos ia se desgastando (principalmente pelas coisas que ela me escondera desde o inicio do namoro – infelizmente nem toda mulher é santa).

Aos poucos tivemos nossos momentos, e o sentimento que era apenas uma atração inexplicável tornara-se meu vício e inicio de uma paixão daquelas que deixa qualquer um completamente desesperado. Ela também já não estava mais aguentando a pressão da atração, a necessidade de estar presente, a vontade de estar comigo.

Como eu já disse de inicio, eu era um cara bom. E não consegui ficar assim por muito tempo, sempre detestei a pressão das línguas alheias. Era horrível estar querendo alguém que eu não podia ter, e estando com alguém que me queria e que eu não sentia nada. Sofri lentamente, pesadamente até que eu me senti completamente dormente. Ela também sofria, dessas dores desesperadas de quem precisa urgente de um pouco do veneno da traição. De repente o surto. A briga. O total desentendimento. O sumiço.

Terminei meu namoro mesmo sem ter contato algum com a Sandra. E o fiz por não mais sentir absolutamente nada além de pena da Diana que estava comigo por amor (o amor é péssimo - um filho da puta mesmo). Eu sofri porque a Diana sofreu. Não queria que as coisas terminassem assim, mas eu precisei parar de iludi-la. Passei depois desse fim de namoro alguns momentos péssimos. E a Sandra resolveu aparecer. Como quem ressurge das sombras. Lembro muito bem que a Raissa estava comigo quando a gente voltou a discutir.

- Você aqui?
- É, eu queria te ver. Saber se está tudo bem.
- O que você acha? Você some, desaparece, me ignora e aparece aqui pra me ver e saber como eu estou?
- Eu sei que estou errada em aparecer assim do nada, e te perguntar isso. Só que eu estava sentindo sua falta.
- Não sei qual o seu problema garota, eu realmente não te entendo. Porque você sumiu?
- Eu não sei. Eu precisei sumir. Eu não estava mais conseguindo lidar com o que eu estava sentindo.
- Porque não falou pra mim?
- Porque eu não queria aceitar.
- Aceitar? Você se confunde toda, eu não te pedi absolutamente nada.
- Aceitar sim, eu estou apaixonada por você.
- Você não está. Tu ainda gosta daquele teu ex que foi morar em SC. Não confunde as coisas.
- Eu não estou confundido. Eu sei o que estou sentindo. E não estava mais suportando segurar isso.

O silêncio pairou pela sala. A Raissa, o Edilson, e outros amigos saíram, mas ambos, Sandra e eu, permanecemos com os olhares fincados um no outro, os olhares atravessavam-se, e as nossas suposições se perderam, as vontades se avolumaram. Meu olhar a percorria em extensão, do fio de cabelo até a ponta dos pés, de mansinho, quase que a revirando pelo avesso, olhar retribuído, e que eu jamais reconheci em nenhuma outra mulher. Foi instintivo, profundo e despudorado. O corpo exclama, os corpos se pediam. E num beijo úmido surgido, como uma taça de vinho a ser degustada, a mão que lentamente prendia minha nuca, o corpo que parecia ferver, e a concentração desfeita, na lascívia nos perdemos, os sentidos pareciam duplicarem-se. E eu finalmente adoeci daquela mulher.
“Encosta a tua vontade na minha,
acerta o teu relógio pelo meu,
divide a cama comigo,
à tarde, naquela soneca mansinha,
e de madrugada, correndo perigo,
quando eu disser que o meu sono desapareceu,
te pedir num suspiro : "Me namora?",
e me despir sob o teu olhar atento.
Eu acompanho os teus passos pela vida afora
e te guio pela mão, sonho adentro.”


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

I'm miss your touch - Emily Browning

A vergonha

Indignada...