"O descontentamento é o primeiro passo na evolução de um homem ou de uma nação." (Oscar Wilde)

“O caminho dos paradoxos é o caminho da verdade.


Apesar do acaso das situações (assim quero chamar no momento), sinto uma imensa necessidade de escrever, e mesmo satisfazendo essa vontade imensa com qualquer assunto banal, a vontade é única e requer mais que somente teclas vazias (“se é que me entendem?”). Resolvi falar exatamente o que me perturba. O que me retira do travesseiro todas as noites. O que não me faz parar de pensar.

Bom, tentarei ser breve. Se for possível ...

Com todos os ocorridos dos últimos meses, com minha falta de tempo, e com a indisposição de aceitar aquilo que está tão estampado na cara, me veio uma espécie de clareza pessoal. Uma clareza daquilo que me reflete não somente no espelho, mas na alma. E como eu poderia dizer tais palavras, se ainda assim, tendo lucidez, me conheço tão pouco? É muito simples, não leva tanto esforço, mas requer aceitação própria. Hoje, por obra do destino, me enxergo de forma clara, e também se pudesse escrever com tal exatidão, colocaria o tal infinito na definição. É mais complicado, porque me entendo sem entender, talvez pela força do hábito, é como se a cada dia conhecesse uma parte nova, e deixasse outra mudar, pra no dia seguinte recomeçar novamente. Ademais, o que posso eu fazer com aquilo que entendo de mim? Até porque conhecer a si própria tão bem é como barganhar sofrimento pessoal diário – já ocorreu algumas vezes, até agora ainda não me recuperei da última. Digamos que esse conhecer é muito arriscado – é como se fosse mais cômodo estar na ilusão. E o que há de se pedir, calma ao coração, desabilitando essa inquietação de querer mudar. Talvez seja interessante manter consistente em algum momento aquilo que sinto, e só assim, ser mais possível.

Suponho que ninguém vive num mundo recluso e tranquilo. E muito menos eu. Então, convenhamos, é correto que eu te explique como ocorreu esse momento contínuo de clareza pessoal.

O celular despertou, eram 5:30 da manhã de uma segunda feita. Era o momento de recomeçar. Levantou, fez todo o processo pessoal antes de sair de casa, e foi para o ponto de ônibus. Olhou para a cara do cobrador, não muito amistoso, acenou por educação (mesmo estando com aquela vontade de ignorar a existência daquele indivíduo de rosto fechado). Ao desembarcar no outro ponto, vendo uma senhora sentada no chão, pegou algumas moedinhas e deu de todo o coração, e recomeçou a sorrir, como se a partir daquele momento a semana de fato tivesse se iniciado. Saindo dali em direção ao local de trabalho, seguiu, como se houvesse um rumo a seguir.

Começou o trabalho, e logo eram 10:20, o horário preferido pra tomar o café de todo dia. Foi até a lanchonete que ficava logo em frente ao escritório, e pediu uma xícara caprichada. Enquanto isso, senta uma senhora do lado esquerdo, e um outro rapaz de preto.

- Você deveria ter vergonha na cara meu filho, deveria tomar juízo. – Disse a senhora.
- Eu tenho vergonha na cara vovó. – retrucou o rapaz – Acho que a senhora deveria entender a minha opinião, e talvez valorizar aquilo que sou. A senhora não deveria me julgar por aquilo que acha que sabe, mas pelas minhas atitudes.
- Eu estou vendo quem você é perfeitamente. Não sou cega!
- Se de fato me visse como sou, talvez seu julgamento fosse mais verdadeiro. Talvez enxergando meu caráter, minha boa vontade, e tudo por aquilo que tenho lutado, talvez essa minha aparência esquisita, ou o fato de não fazer a barba, fossem para ti irrisórios.

Sabe, eu tenho essa pequena impressão da vida, de que nem tudo deve ser olhado com os olhos, até porque nossa faixa de visão é ínfima. Aquele rapaz não tinha motivo pra reclamar ou deixar doer-se por uma visão pequena, e deixar tão claro em qual “parte do corpo” dói mais, e gritar ao mundo que tipo de alma se tem.

Então me pergunto. E se ninguém enxergar o outro? Pior ainda, e se ninguém se enxergar bem?

Vivemos numa sociedade em que tudo se baseia em palavras rasas, em falácias. “Você tem que ser aquilo que é”, “tem de mostrar quem és”, “você não presta, tá se fazendo de santa”, enfim, frases muito comuns, frases que quando combinadas, parecem pólvora e fósforo. E se alguém, em algum momento, resolver levantar e gritar que isso é condenável?

Eu tenho algumas coisas muito sérias pra dizer. Uma delas é que nem todas as pessoas são iguais e agem igualmente. Assim como nem todos gostam e sentem o mundo da mesma forma. Cada qual apresenta uma alma prolixa, profusa, incompreensível até pra si mesmo, e não cabe a ninguém julgar.
E sabe o que as pessoas fazem quando alguém se levanta pra lutar por aquilo? Elas ficam caladas. Incrédulas. Sem moral e sem saber onde enfiar a cara.


Antes daquela conversa, eu era apenas uma pessoa que queria um café. Depois daquela conversa, eu notei minha cara fechada, e não a cara do cobrador. Quem será que precisava modificar-se? Pois é, e cá estou, nessa mudança pessoal, vendo meus erros serem tão grandes que tornam-se fardos, e ao mesmo tempo me ensinam o “cautelar-se”. 
“Os pequenos atos de cada dia fazem ou desfazem o caráter.

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